Em livro, especialista destrincha as diversas nuances que envolvem o transtorno de ansiedade, cada vez mais presente na população brasileira
Desde 2017, o Brasil registra o maior índice de pessoas com algum transtorno de ansiedade em todo o mundo. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o País tinha, em 2019, 18,6 milhões de habitantes ansiosos, o que representava, à época, 9,3% de sua população.
A chegada da pandemia de Covid-19, em março de 2020, apenas agravou a situação. Atualmente, o brasileiro se diz muito ansioso em relação à sua situação financeira, à sua saúde e de seus familiares e quanto aos rumos que o País toma, de forma geral.
Nesse sentido, vale a recomendação de um livro que promete atuar como um verdadeiro guia para ajudar os leitores a superar os maus hábitos que geram agitação, preocupação e medo. Em Desconstruindo a Ansiedade (Editora Sextante, 256 páginas, R$ 50), o neurocientista Judson Brewer, psiquiatra e professor da Universidade Brown (EUA), sintetiza 20 anos de pesquisa para apresentar soluções que, segundo ele, foram testadas e aprovadas por milhares de pacientes.
De imediato, o especialista procura desmistificar a crença de que a ansiedade contempla apenas dois cenários extremos: um desconforto leve ou um ataque de pânico. De acordo com ele, a ansiedade está relacionada a diversos comportamentos viciantes e a maus hábitos, como comer demais mesmo sem apetite, procrastinar, beber para relaxar e passar horas nas redes sociais.
“A ansiedade se camufla nos hábitos. Ela se esconde em nosso corpo quando aprendemos a nos desconectar desse sentimento por meio de uma infinidade de comportamentos diferentes. Ao compreender essa conexão, pude ajudar meus pacientes a perceber como formaram hábitos em torno de tudo – desde beber demais e comer por estresse até procrastinar – como meio de lidar com a ansiedade. Também pude contribuir para que entendessem por que tinham tanta dificuldade e fracassavam ao tentar superar não só a ansiedade como os maus hábitos. A ansiedade alimentava os outros comportamentos, que então perpetuavam a ansiedade, até que tudo saía do controle e eles iam ao meu consultório”, escreve, em seu livro.
Ao longo de sua obra, Brewer destaca que a ansiedade habita uma região do cérebro que resiste à racionalidade e esta é uma das principais razões pelas quais se torna tão difícil enfrentá-la. Para reverter esse cenário, o especialista busca ensinar os leitores a identificar os gatilhos da ansiedade, neutralizá-los e substituí-los por comportamentos que trazem bem-estar.
“Uma das principais coisas que aprendi é que na psiquiatria vale a máxima ‘quanto menos você sabe, mais você fala’. Em outras palavras, quanto menos você entende uma situação, mais preenche esse vazio com palavras. No entanto, mais palavras não significam uma interpretação melhor nem mais conhecimento sobre os pacientes. Na verdade, quando você não sabe do que está falando, e mesmo assim fala sem parar, é grande a probabilidade de se enfiar em um buraco; uma vez dentro dele, pare de cavar, combinado?”, explica.
Ansiedade agravada
A pandemia gerada pela Covid-19 foi mais do que suficiente para agravar a crise de ansiedade que afeta milhões de brasileiros. Pessoas que até então nunca haviam registrado episódios de ansiedade, viram-se na necessidade de buscar auxílio psiquiátrico e/ou psicológico, muitas vezes com certa urgência.
O próprio Ministério da Saúde identificou a importância de mapear, de alguma forma, a evolução dos transtornos de ansiedade na população brasileira. Em pesquisa realizada nos meses de abril e maio de 2020 com mais de 17 mil pessoas, a pasta identificou que 86,5% dos entrevistados estavam enquadrados em algum tipo de ansiedade patológica.
De lá para cá, a situação certamente se agravou. Ingressamos no terceiro ano de pandemia e simplesmente não há quem consiga passar ileso pelos cenários de perdas provocadas, de alguma forma, pelo vírus. Sejam perdas financeiras, de saúde ou, no pior dos casos, de vida de familiares e amigos.
Em seu livro, Brewer trata da ansiedade em quatro partes. A primeira – identificada como parte 0 – explica como a ansiedade se instala, recorrendo a conceitos da psicologia e da neurociência. Na sequência, o autor aborda como identificar os gatilhos da ansiedade, apontando também o que a ansiedade em si provoca. “A parte 2 ajuda a entender por que você fica preso em ciclos de preocupação e medo e ensina como atualizar as redes de recompensa do cérebro para se libertar”, completa.
A última parte (3) traz ferramentas simples que utilizam os centros de aprendizagem do cérebro para romper os ciclos de ansiedade (e outros hábitos) de uma vez por todas.
Um dos principais méritos do autor é usar farto material de pesquisa, considerando principalmente seu histórico profissional, para explicar de forma muito didática os elementos que compõem a ansiedade.
Além disso, sua escrita é sincera ao expor, por exemplo, que o que transforma a ansiedade cotidiana em “transtorno” depende em parte de quem faz o diagnóstico. Em sua definição, o Transtorno de Ansiedade Generalizada é característico de pessoas que tenham ansiedade e preocupação excessivas com “vários assuntos, eventos ou atividades”, e isso tem que ocorrer “com bastante frequência durante pelo menos seis meses e ser claramente excessivo”.
“Como a ansiedade costuma ser intensa e não se manifesta de maneira tangível, tenho que fazer muitas perguntas a meus pacientes para saber como a [ansiedade] deles se manifesta”, explica.
Por isso, o livro do especialista acaba sendo tão importante para expor muitas nuances da ansiedade. E o mais importante: ressalta que o auxílio profissional é essencial para quem deseja controlar e entender melhor sua ansiedade.
Escrito por: Redação