Em entrevista à Mercado Automotivo, Joaquim Leal, presidente da Medauto, recorda o que foi necessário para que a empresa chegasse com vitalidade e saúde financeira aos seus 50 anos, completados em 2021.
De acordo com Leal, uma das difíceis decisões que devem ser tomadas pelas empresas atualmente diz respeito ao perfil generalista ou especialista nos negócios. Em meio a um número cada vez maior e diversificado de marcas e veículos, os players do aftermarket devem avaliar com calma a viabilidade de atender uma gama ampla de itens ou focar em “somente” um segmento do mercado. “É uma decisão muito difícil de ser tomada”, avalia o executivo da empresa, que atua como revendedora e distribuidora de autopeças para caminhões e utilitários. Confira a entrevista a seguir:
Mercado Automotivo – A Medauto completa 50 anos em 2021. O que esta marca representa à empresa?
Joaquim Leal – Os 50 anos representam um momento de orgulho e sucesso. Significam solidez no nosso trabalho. Para chegar até aqui foi necessário muito trabalho, foco, dedicação à empresa, deixando-a sempre em primeiro lugar. É necessária muita atenção para não misturar a empresa com sua vida pessoal. O capital da empresa é da empresa e o capital de sua vida é resultante do lucro, nunca misturando as atividades.
Chegar aos 50 anos também representa sempre o olhar para frente. O mercado automobilístico tem sempre novidades e é preciso atualizar seu portfólio o tempo todo. É preciso falar a língua do seu cliente e acima de tudo colocar o foco em muito trabalho.
MA – Foram muitas as mudanças durante esse caminho?
JL – Foi preciso se reinventar sempre, se atualizar. Quando a Medauto nasceu, não tínhamos computadores. Depois, passamos a ter um computador e só depois chegamos a uma rede de computadores. É um trabalho que exige investimentos. Em outras palavras, é preciso reverter os lucros em investimentos na própria empresa. Se você não fizer isso, não chega aos 50 anos.
MA – Você entende que os consumidores atualmente mudam e adaptam suas demandas de forma muito mais dinâmica?
JL – Sim. As coisas hoje acontecem com maior rapidez, pois a comunicação hoje é muito ampla. O fator comunicação fez toda a diferença na maneira de trabalhar. Nossa primeira filial, há 50 anos, era localizada em Mogi das Cruzes, muito longe. O telefone era o único caminho para se comunicar, e mesmo assim não era fácil ter um aparelho. Hoje as comunicações são muito práticas. E não é só prático para mim, é prático para o meu cliente.
A logística também mudou. Você passa a ter não só concorrentes locais, mas concorrentes do Brasil inteiro, pois tudo chega muito mais rápido e todas as informações estão disponíveis para o consumidor. Portanto, concordo sobre que as coisas têm mudado com muita facilidade, e provavelmente continuarão mudando. Não sabemos o que irá mudar, mas sabemos que a comunicação é o principal fator de mudança. A facilidade para comunicar-se.
MA – O Brasil vem enfrentando uma crise que já dura alguns anos. Quais os segredos para manterem-se saudáveis no mercado?JL – Entendo que o principal cuidado para se manter vivo em meio a esta crise está relacionado à administração dos custos, de modo a gerar lucro e promover equilíbrio no fluxo de caixa.
MA – Pensando especificamente no setor automotivo, o que você considera mais urgente: uma reforma tributária ou o investimento direcionado à infraestrutura nacional?
JL – Considero a reforma tributária uma prioridade para o nosso setor e todos os outros. Um dos principais pontos a motivar uma reforma tributária é que, se você não tiver filiais em todos os estados do País, não consegue vender no Brasil inteiro. Então, em outras palavras, do jeito que está hoje, a empresa precisa abrir uma filial em cada estado. Isso economicamente não é viável. Não se consegue abrir uma filial em São Paulo e outra com a mesma estrutura em uma capital menor. Não cabe. Ou você compra uma filial pequena ou não atende essa capital. São decisões que o sistema tributário atual impõe.
Creio então que a mudança é importante, e também por outras razões: há uma dificuldade em entender a legislação, e o sistema de pagamento de impostos é caro. Você paga tudo de forma antecipada, quer efetue a venda ou não. Você paga na compra, não na venda, e isso exige capital de giro maior.
Fora a insegurança jurídica que a questão tributária impõe atualmente. Nunca se sabe, com certeza, se está fazendo a coisa certa. É muito comum você fazer algo de um jeito, seu concorrente fazer de outro e quem está certo, afinal? Ninguém sabe. Porque o concorrente tem consciência que o dele está certo e eu tenho consciência que o meu está certo. Não há desonestidade, mas é confuso. Isso gera desgaste e insegurança jurídica.
MA – Há divergências no setor automotivo (bem como em outros setores) quanto ao perfil a ser adotado pelas empresas. Alguns defendem a especialização em determinados segmentos e produtos. Outros entendem que é necessário ser um “generalista”, em razão da constante demanda por novas peças e serviços. Há um modelo mais adequado aos dias atuais?
JL – Essa é uma pergunta que me faço todos os dias. Não sei a resposta, mas entendo que ser generalista exige muito capital e está cada dia mais difícil. Cada modelo tem suas vantagens, mas ser generalista atualmente é muito difícil. Você não consegue ser generalista no sentido amplo da palavra. Por mais que você o seja em marcas, não consegue ser em portfólio. Não é possível ter todos os produtos, ser bom em suspensão, em freio, em motor, em câmbio, para todas as marcas e veículos. Isso é basicamente impossível.
Você acaba tendo de se especializar em alguma área, ainda que tenha muitas marcas de veículos. É uma decisão difícil de ser tomada. As marcas e o mercado estão muito fragmentados, diferentemente das décadas anteriores. É uma decisão complicada, que não deve ser tomada de um dia para o outro, e sim de acordo com o caminho que você vai trilhando. A própria tecnologia vai fazendo você se moldar, se ajustar, é inevitável.
MA – Alguns analistas de mercado entendem que as crises econômicas podem produzir um efeito diverso no setor automotivo. Ao diminuir o poder de compra do cidadão, a crise acaba fazendo com que os consumidores priorizem a manutenção de seus veículos usados, impulsionando o aftermarket. Concorda com isso?
JL – Sem dúvida, quando não se compram carros novos, prioriza-se a manutenção do carro velho. E mesmo os carros novos não demoram a entrar no mercado do aftermarket. Entendo que o mercado está aquecido em virtude da pandemia, está interessante. As fábricas já têm dificuldades para entregar caminhões novos e isso faz com que, obrigatoriamente, as pessoas tenham de fazer a manutenção de sua frota.
Então, é de se esperar que, se não houver nenhuma trovoada não prevista, os próximos anos devem ainda continuar sendo bastante movimentados para a linha pesada. E na linha de passeio, o grande risco é a eletrificação dos veículos, um cenário em que ainda não sabemos como o Brasil irá se encaixar.
MA – Que mensagem deixa aos colaboradores e clientes da Medauto nesse momento delicado do País?
JL – Nossa política é sempre dar apoio e respeito aos nossos colaboradores e clientes, independentemente da situação econômica. Nestes tempos de pandemia, temos que ser mais prestativos e tolerantes e, acima de tudo, otimistas com dias melhores pela frente.
Escrito por: Redação