Com o avanço da vacinação, empresas retomam o trabalho presencial, mas cuidados são necessários
Somente no Brasil, a epidemia de Covid-19 causou, nos últimos dois anos, mais de 650 mil mortes, em um cenário de mais de 30 milhões de casos registrados. A ampliação da vacinação, no entanto, fez com que as pessoas voltassem a pensar em quando poderiam, enfim, retornar a tarefas e atividades aparentemente tão simples em suas vidas.
No início de abril, ao menos 75% da população brasileira já estava completamente imunizada. Por todo o País, eventos presenciais começaram a retornar de forma escalonada, ampliando a quantidade de pessoas presentes ao longo das semanas. Com isso, empresas e colaboradores naturalmente passaram a questionar quando (e como) retornariam ao trabalho presencial.
O retorno ao presencial, no entanto, não é assim tão simples quanto alguns podem pensar. Sequer o modelo híbrido (com parte da semana presencial e parte remota) é algo que prescinde de adaptações e cuidados por meio das gestões das empresas. Afinal, em alguns segmentos, foram mais de dois anos de trabalho essencialmente remoto, com raríssimos encontros pessoais entre os membros das equipes.
Dentre as principais preocupações de gestores dos mais diversos setores está a manutenção de medidas de proteção, de modo a evitar focos de contaminação de seus funcionários por Covid-19. Além disso, como resgatar a motivação e a dedicação dos funcionários se o modelo de home office era amplamente aceito (e preferido) pela maioria?
Retorno aos escritórios
Ao longo da pandemia, a consultoria KPMG divulgou periodicamente a pesquisa “Covid-19: como será o seu retorno aos escritórios”. A sexta edição do levantamento (e também a mais recente) considerou dados coletados em julho e agosto de 2021 e consultou 287 empresários de todas as regiões do Brasil, pertencentes aos mais diversos setores da indústria e do comércio.
Os executivos foram questionados, por exemplo, sobre o momento em que a empresa pretendia voltar ao escritório, após o início da vacinação. Mais da metade (52%) já pretendiam retornar aos escritórios no segundo semestre de 2021. Outros 40% indicaram a volta para o primeiro semestre de 2022, e somente 8% planejavam o retorno para o segundo semestre deste ano.
O que atrapalhou sensivelmente os planos de muitas empresas foi a própria evolução da pandemia, com o surgimento de novas variantes do coronavírus, como a omicron. Com a disseminação da doença ampliada, governos e empresas decidiram retardar a suspensão de determinadas medidas de proteção a cidadãos e funcionários.
A propagação dessas novas variantes talvez tenha fomentado uma transição mais gradual entre o modelo de trabalho remoto e o presencial. Com isso, cresceu em muitos setores a adoção de um regime de trabalho híbrido, com dois ou três dias de atuação presencial, principalmente para cargos e funções que conseguem desempenhar seu trabalhar remotamente sem grandes prejuízos.
Já em julho e agosto, de acordo com a KPMG, o modelo híbrido era bem aceito por boa parte dos empresários consultados. Segundo o levantamento, 29% das empresas pretendiam manter o home office ao menos duas vezes por semana. Outros 29% eram favoráveis ao trabalho remoto em três dias da semana. Somente 15% dos entrevistados indicaram a adoção integral do trabalho presencial para os meses seguintes.
Cuidados de higiene
Em outro estudo também realizado pela KPMG e divulgado no segundo semestre de 2021, 84% dos entrevistados acreditavam que, com a vacinação em andamento, os setores em que atuavam levariam cerca de 6 meses a um ano para se recuperar.
Apesar do otimismo, é opinião consolidada entre infectologistas e outros especialistas da Saúde de que a vacinação não exime cidadãos e empresas a deixarem de adotar algumas das medidas de prevenção que o Brasil acolheu nos últimos dois anos.
O uso de máscaras, mesmo em ambientes fechados, deixou de ser obrigatório em muitas cidades do País. No entanto, em diversos escritórios, alguns funcionários optam por manter sua utilização, pois entendem que o item os resguarda principalmente nesse momento de retomada das atividades presenciais.
A disponibilização de álcool em gel para todos os funcionários e o eventual uso de acrílicos ou proteções diversas entre as baias de trabalho são medidas que mantiveram sua importância mesmo com o avanço da vacinação no País.
A questão do distanciamento entre os funcionários, no entanto, já reserva mais dificuldades. Isso porque, mesmo antes da pandemia, muitas empresas já não dispunham de espaços amplos para ampliar a distância física entre seus colaboradores. Durante a pandemia, cortes de gastos se fizeram necessários para enfrentar a crise econômica gerada e partes das companhias optou por reduzir seu espaço físico, diminuindo sensivelmente os custos de locação e demais itens de suprimentos.
De acordo com a KPMG, cerca de 40% das empresas consultadas reduziram seu espaço físico durante a pandemia no Brasil, e pretendiam seguir com essas dimensões mesmo após o fim da pandemia. Outros 13% sinalizaram que houve redução, mas afirmaram que pretendiam retornar aos níveis pré-pandemia.
Nesse cenário, alocar os funcionários com segurança em um espaço físico reduzido se torna ainda mais desafiador. Ao longo dos últimos meses, muitas empresas que retomaram suas atividades presenciais viram que o mais adequado era manter parte de seu quadro trabalhando de casa, ao menos durante parte da semana. Somente através de um rodízio entre os funcionários seria possível alocar as equipes com segurança, evitando a contaminação em massa dos colaboradores.
Trata-se de uma equação delicada e muitas empresas demoram a entender que é mais vantajoso manter parte de suas atividades de forma remota. Algumas funções naturalmente exigem a presença física dos colaboradores, mas atividades relacionadas a administração e recursos humanos, por exemplo, podem ser feitas de casa sem grandes prejuízos.
Dúvidas e orientações
Ao longo dos últimos meses, com o arrefecimento da pandemia e a ampliação da vacinação, alguns gestores se depararam com algumas dúvidas relativas ao trabalho presencial. Afinal, por exemplo, a empresa pode exigir a volta de seus colaboradores ao modelo presencial?
A resposta é sim. Desde que, para isso, a empresa adote os protocolos sanitários de segurança determinados pelo poder público. Ou seja, precisa fornecer as condições adequadas para que os profissionais não tenham de se expor ao risco de contaminação por Covid-19.
Pessoas que integram grupos de risco (como gestantes, por exemplo) podem se recusar ao retorno imediato, desde que apresentem um atestado médico sobre suas condições de afastamento das funções que desempenham.
Em caso de recusa injustificada para retornar ao trabalho presencial, o empregador pode advertir, suspender ou até mesmo demitir o colaborar por justa causa. É preciso atentar-se também às regras para o retorno ao local de trabalho. Com base no artigo 3º da Medida Provisória nº 1.046/2021, a convocação do trabalhador deve respeitar uma antecedência de, no mínimo, 48 horas para que seja válida.
Além disso, esse momento de transição exige uma série de cuidados especiais para as equipes de Recursos Humanos. A Mercado Automotivo elenca a seguir alguns cuidados que podem e devem ser observados no retorno ao trabalho presencial, após meses (ou até anos) de modelo unicamente remoto:
– Evite aglomerações desnecessárias: o home office mostrou a muitas pessoas que reuniões podem ser feitas de forma online, facilitando, inclusive, a participação de pessoas sitiadas em outras regiões. Mostrou, ainda, que nem tudo precisa gerar uma reunião. No retorno ao trabalho presencial, mantenha em mente essas ideias, principalmente para evitar aglomerações desnecessárias entre os colaboradores. Se puder, resolva em um e-mail. Se não puder, priorize calls e reuniões virtuais, cada um em sua mesa.
– Incentive horários flexíveis: seja flexível com os horários de trabalho dos colaboradores. A menos que seja realmente necessário, promova diversos horários de entrada e de saída, adequando-os, na medida do possível, às necessidades de cada funcionário.
– Promova orientação e reforço constante: com o passar das semanas, reforce algumas medidas essenciais à proteção dos colaboradores, tais como: cuidados com aglomerações no horário de almoço e pausa para café; importância de não compartilhar objetos de uso pessoal; cuidados com confraternizações durante e após o trabalho, priorizando grupos pequenos.
– Promova, se possível, o retorno gradual dos funcionários: ainda que seu entendimento, como gestor, seja o de retorno ao trabalho presencial em todos os dias da semana, permita que os funcionários façam esse movimento de forma gradual. Ao menos nos primeiros meses.
A pandemia fez com que muitas pessoas tivessem necessariamente de se adaptar ao trabalho remoto, incluindo aí todos os benefícios e dificuldades atrelados a esse modelo de trabalho. Ao regressarem à empresa, os funcionários precisam se acostumar novamente a acordar mais cedo, se arrumar para o ambiente de trabalho diariamente, enfrentar o trânsito dos deslocamentos e voltar para casa em horário mais elevado. Esse cenário naturalmente desanima boa parte dos funcionários. Por isso, nesse primeiro momento, permita que esse retorno seja gradual.
– Conscientize a equipe sobre a importância de retornar: diante das benesses de trabalhar de casa, muitos colaboradores simplesmente não veem motivo concreto para retornar ao presencial. Mostre que a volta é racional, necessária e amparada em necessidades da empresa e do próprio funcionário. Deixe claro também os tipos de trabalho cuja execução muda sensivelmente se feito de forma presencial.
– Fique atento à saúde mental dos funcionários: os tempos são difíceis e isso não é novidade para ninguém. Mesmo tendo conseguido manter seu emprego, o funcionário pode ter vivenciado a perda de familiares ou amigos por conta da Covid-19, e ter enfrentado outras dificuldades, como a financeira, em razão da crise que o País atravessa.
Nesse sentido, uma mudança desse porte (do remoto ao presencial), pode desencadear ou agravar quadros de ansiedade e/ou depressão nas equipes. Promova um acompanhamento adequado, mostrando aos funcionários que as lideranças estão atentas e sensíveis ao difícil momento enfrentado por todos.
As orientações devem ser adaptadas de empresa a empresa, a depender de seu porte, setor de atuação e necessidades de trabalho presencial. Vale destacar ainda que não há uma “receita de bolo” para o enfrentamento da pandemia de Covid-19. Muitos planos e estratégias precisaram ser refeitos para acompanhar mudanças que surgiram ao longo dos últimos meses. O importante é sempre estabelecer planos claros junto a diversas áreas da companhia, passando pelos Recursos Humanos e pelas lideranças de cada segmento.
Escrito por: Redação