A revista Mercado Automotivo traz entrevista exclusiva com Cláudio Sahad, novo presidente do Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores) e da Abipeças (Associação Brasileira da Indústria de Autopeças). Confira a seguir:
Mercado Automotivo – O senhor assume o Sindipeças para um mandato inicial que vai até 2025. Quais são os principais desafios que vislumbra para sua gestão?
Cláudio Sahad – Serão muitos os desafios. A indústria automotiva mundial nunca passou por momento tão disruptivo. Numerosas mudanças tecnológicas exigem adaptação das empresas, como Indústria 4.0, digitalização, Inteligência Artificial (IA), Internet das Coisas (IoT). O Sindipeças tem olhado muito especialmente para as pequenas e médias empresas do setor, que são os fabricantes de componentes e formam a base da cadeia de fornecimento automotivo, sendo fundamentais para que o País tenha relevância na produção de autopeças.
O papel do Sindipeças é, em primeiro lugar, prover informação a elas. Essas empresas têm de estar cientes das mudanças que estão acontecendo. É trabalho de sensibilização, de mostrar que é mandatório se adaptar às mudanças para não perder competitividade. Para isso, temos várias frentes de atuação, com nossas empresas, com outros elos da cadeia de produção e com instâncias do governo.
MA – Pensando em um cenário nacional, o senhor entende que o pior da crise gerada pela pandemia de Covid-19 já passou? Podemos ser otimistas com os próximos 3 anos?
CS – Ao que tudo indica, os efeitos da pandemia estão terminando. Pelo menos é isso que esperamos. Outro obstáculo que precisamos vencer, mundialmente, é a escassez de componentes, principalmente os semicondutores, que fez a produção mundial de veículos cair em 2021 e deve fazer o mesmo este ano. Mas, mesmo com esses obstáculos, seguimos em frente, com energia e disposição.
MA – Muito se fala a respeito dos veículos elétricos, mas alguns analistas de mercado entendem que o avanço desse tipo de modelo no Brasil segue muito lento. O senhor concorda? Há uma perspectiva de avanço para o carro elétrico no Brasil?
CS – A eletrificação é uma das opções para a redução das emissões de carbono, mas não a única. O Sindipeças entende que há forte tendência para a propulsão elétrica, porém, ainda existem muitas dúvidas com relação à tecnologia que irá predominar com relação à alimentação das baterias. Imaginamos que várias tecnologias deverão coexistir, sendo aplicadas em maior ou menor intensidade nas diversas regiões do planeta, conforme as condições de cada local.
Também haverá, ainda por algumas décadas, a utilização do motor a combustão. O Brasil pode até mesmo vir a se tornar um polo produtivo mundial desses motores.
O Sindipeças participa ativamente do tema e é uma das entidades que integram o Mobilidade Sustentável de Baixo Carbono (MSBC), movimento criado para “promover a cooperação multidisciplinar sobre temas relacionados à descarbonização da mobilidade, contribuindo para as discussões sobre políticas públicas que envolvam tecnologias de baixo carbono, entre elas a hibridização e a célula de combustível que usem fontes sustentáveis de energia, estimulando o desenvolvimento econômico equilibrado e socialmente inclusivo”. Para o Sindipeças, o Brasil tem larga experiência na utilização do etanol como combustível veicular limpo e sustentável. Entendemos que esse diferencial não deve ser desperdiçado.
MA – Gostaria que falasse sobre o aspecto da inovação no setor da reposição automotiva. O senhor entende que os players do setor ampliaram os investimentos em inovação em suas atividades na última década? Como conciliar esse fomento à inovação em momentos de crise econômica como a que enfrentamos agora?
CS – Apesar das dificuldades, o setor de autopeças nunca representou gargalo na produção automotiva, nem no período de 2014 a 2016, quando enfrentamos a pior crise de nossa história. As empresas com forte presença na reposição são igualmente atendidas por nossa associação e recebem todas as informações para que acompanhem a evolução do mercado.
Aproveito para destacar que em nosso 3º Encontro da Indústria de Autopeças, que ocorre em 20 de junho, haverá painel em que serão discutidas as Megatendências na Reposição, com apresentações da Bosch e do Grupo Randon. Como a reposição deve se preparar para o impacto da concorrência dos novos market places e para a inovação trazida por temas como digitalização, descarbonização e conectividade, por exemplo. Veja como o programa é interessante e abrangente.
MA – De que forma o Sindipeças apoiará as pequenas e médias empresas de autopeças em sua gestão?
CS – O apoio será integral, como foi nas gestões anteriores. Temos um comitê de PMEs que se reúne periodicamente para refletir sobre os temas de mais impacto para empresas desses portes. Além disso, fornecemos muitas informações sobre os programas de investimento em inovação, no âmbito do Rota 2030, por exemplo.
MA – Gostaria que falasse também sobre a importância das PMEs para o fortalecimento do setor. Com a pandemia, esse segmento de empresas foi um dos mais afetados pela crise no País.
CS – As PMEs, que fabricam os componentes utilizados na montagem dos sistemas, são a base da cadeia de produção. Sem elas, tudo teria de ser importado, o que é inviável. No quadro de associados do Sindipeças, que soma cerca de 500 empresas, elas representam aproximadamente dois terços. Destaco que essas empresas têm sido muito resilientes às diversas crises que atravessamos nos últimos anos.
Reitero que, na atual falta de componentes no setor automotivo, não existe nenhuma participação das empresas nacionais, que têm cumprido integralmente os programas de entrega de seus clientes. Ao contrário, essas empresas têm sido prejudicadas, uma vez que o cliente final, em virtude da falta de componentes importados, muitas vezes deixa de produzir e corta os programas de entrega aos fornecedores locais.
MA – Qual sua opinião sobre o nível de digitalização das empresas e dos processos que hoje envolvem o setor de autopeças no Brasil? É possível comparar o nosso cenário com o de outros países?
CS – Há países em que o quadro macroeconômico é muito mais favorável que o nosso. No Brasil, ainda temos de lidar com ambiente de negócios desfavorável, que provoca insegurança e custos desnecessários, de várias naturezas. Mas, mesmo consideradas as dificuldades, o setor de autopeças no País, composto também por empresas multinacionais importantíssimas, segue preparado para atender a todas as montadoras aqui instaladas e ao mercado de reposição de uma frota de mais de 46 milhões de veículos. Além das exportações, que são também relevantes.
MA – Como o Sindipeças pretende incentivar o tema da mobilidade sustentável junto a seus associados? Qual é a importância deste tema em seu plano de gestão?
CS – O tema é importantíssimo. Além de participar do MSBC, como mencionei anteriormente, o Comitê de Sustentabilidade do Sindipeças, formado por representantes de empresas associadas, realiza reuniões trimestrais, em que são apresentados projetos de sustentabilidade com significativos resultados ambientais, sociais e econômicos. O grupo também organiza o Fórum de Sustentabilidade, evento anual que ocorre há 17 anos, quando esse tema nem tinha tanto destaque quanto tem atualmente.
MA – Por fim, gostaria que deixasse uma mensagem para todos os associados do Sindipeças.
CS – Nos últimos anos, as empresas associadas tiveram mais e melhores condições para entender as mudanças mundiais da mobilidade, por meio de ações intensas de divulgação de informações e da participação ativa de nossa entidade na elaboração de programas como o Rota 2030 e o MSBC, para citar apenas dois exemplos. Os líderes que me antecederam, com os quais tive a honra de trabalhar, como representante das PMEs, deixaram marcas importantes, como a qualidade de saber ouvir e a capacidade de conciliar. A nova gestão será a continuidade das anteriores. Contem com o Sindipeças e com a Abipeças.
Escrito por: Redação