Especialistas avaliam impacto da vitória de Donald Trump para a economia global
No início de novembro, o republicano Donald Trump foi eleito para seu segundo mandato na Presidência dos Estados Unidos. Se o resultado em si não foi uma surpresa, é possível dizer que a vantagem obtida pelo empresário em relação à sua adversária, a democrata Kamala Harris, surpreendeu boa parte do mundo.
Nas primeiras horas do dia 6 de novembro, antes mesmo do resultado oficial, Trump discursou na Flórida e afirmou que este foi o “maior movimento político de todos os tempos”. Garantiu ainda que inaugurará uma “era de ouro” nos Estados Unidos. Em discurso relativamente mais contido do que em outras ocasiões, Trump declarou que a América havia dado a ele um “mandato poderoso e sem precedentes”.
Após a consolidação do resultado e os discursos e mensagens de vitória de Trump e de derrota de Kamala, foi a vez de analistas avaliarem o impacto da eleição do republicano no contexto global.
Avaliações iniciais
De acordo com especialistas consultados pela Agência Brasil, o desempenho do próprio Partido Republicano nas eleições como um todo poderá facilitar a aprovação de projetos de Trump.
O desempenho vitorioso não ficou restrito à cadeira presidencial. Os republicanos já conquistaram a maioria dos assentos no Senado, que, atualmente, é controlado pelos democratas, e caminham para assumir também o comando da Câmara dos Deputados.
Se a vitória na Câmara se confirmar, Trump, que já presidiu os Estados Unidos de 2017 a 2021, chegará à Casa Branca contando com a maioria de congressistas que, em tese, estarão mais dispostos a ajudá-lo a cumprir suas promessas de campanha.
“O fato de o Trump ter ganhado não é surpresa. No mercado financeiro, em particular no norte-americano, havia mais apostas nesse sentido. Ainda assim, a expectativa era de que as eleições seriam mais apertadas e, aí sim, o resultado [geral] surpreendeu”, disse à Agência Brasil o economista-chefe da empresa de tecnologia financeira Nomad, Danilo Igliori, classificando o resultado das urnas como “uma vitória maiúscula e incontestável” dos republicanos.
Para Igliori, com o resultado, Trump deve começar sua gestão enfrentando menos resistências à implementação de suas propostas de campanha.
“Conquistando junto o Congresso, Trump terá condições de aprovar sua agenda mais facilmente. A questão é o quanto as propostas de tom mais visceral, agressivo, disruptivo vão, de fato, se materializar nas políticas reais”, ponderou o economista, lembrando que, geralmente, encerrada a disputa eleitoral, é hora dos eleitos adotarem uma conduta mais pragmática.
“Mas acho que o mundo, com o Trump [na presidência dos EUA], é um mundo com mais risco, no qual tendemos a reafirmar um contexto que já é de bastante incerteza. Embora eu ache que os principais vetores não serão fundamentalmente impactados pelo Trump, já que há um fenômeno maior, que é a economia [global] que vem emergindo após a pandemia [de Covid-19]”, acrescentou o economista, referindo-se a rearranjos das cadeias globais de comércio, entre outros fenômenos.
“O principal deles, a meu ver, é uma redução no nível de globalização. Acho que o centro da proposta do Trump, expressa no slogan Make America Great Again [Tornar a América Grande Outra Vez], sinaliza para os Estados Unidos mais isolado, menos inserido nos fluxos globais de comércio e atividade. O que [se acontecer] vai gerar uma série de desdobramentos para as outras nações. Começando pelos impactos da política tarifária e da menor boa-vontade para acordos multilaterais e bilaterais”, apontou o economista.
“Para o Brasil, o cenário tende a ficar bem mais complexo, já que o relacionamento com os Estados Unidos é bastante relevante para nós. Embora isso também possa acabar gerando oportunidades, particularmente no relacionamento brasileiro com a China. Porque, se os Estados Unidos restringirem suas relações com a China, ela certamente vai procurar privilegiar outros parceiros.
Seletividade
Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Instituto Nacional de Estudos sobre os EUA (Ineu), Roberto Goulart Menezes, Trump não é exatamente um político isolacionista.
“Ele tende a uma abordagem que não é [só] dele. O [ex-presidente republicano] George Bush já a adotou no passado. Como também o [ex-presidente democrata] Bill Clinton em certo momento. É uma política de interesse nacional seletivo. Segundo a qual os Estados Unidos admitem que nem todos os temas [globais] os interessam e que há assuntos dos quais outros [países] podem cuidar melhor”, ponderou Goulart, frisando que, paralelamente a isso, Trump considera que, nos últimos tempos, organismos multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), vêm regularmente contrariando aos principais interesses estadunidenses.
“Então, para ele, se os Estados Unidos não têm capacidade de reformar essas instituições para que contemplem seus interesses, é o caso de adotar uma atitude brusca em relação a essas instituições. Caso da OMC, cujo órgão de soluções de controvérsia está paralisado desde 2019 justamente porque os Estados Unidos não concordaram em renovar os árbitros – algo que começou no primeiro governo Bush e que foi mantido na gestão [do democrata e atual presidente] Joe Biden”, lembrou o pesquisador, para quem há “pontos de contato” entre a ação democrata e republicana na defesa dos interesses dos Estados Unidos.
“Desde o governo Clinton, os Estados Unidos vêm tentando reconstruir sua hegemonia política e econômica global – a militar já está consolidada. O Trump também tem isso em seu horizonte. E, para isso, ele adota essa estratégia do interesse nacional seletivo. De forma que os Estados Unidos não vão disputar toda bola dividida”, acrescentou Goulart, que também se disse surpreso com o desempenho dos republicanos nas urnas.
“Primeiro porque as pesquisas apontavam para uma disputa voto a voto [entre Trump e Kamala Harris]. Depois, pela própria trajetória do ex-presidente, que enfrenta processos na Justiça e a consequente exposição midiática negativa. O resultado mostrou tanto que Trump e sua ala política detêm o controle hegemônico do partido, quanto que sua política sobreviveu na memória dos eleitores, mesmo os dados econômicos do governo Biden, agora, serem bons”, avaliou o professor, destacando que, no último período, a inflação oficial caiu e o nível do emprego formal melhorou, embora o custo de vida penalize os consumidores.
Na avaliação do pesquisador, com maioria no Congresso, Trump tentará implementar, já no primeiro ano de governo, mudanças nas leis trabalhistas e de imigração, entre outras medidas que reduzam as despesas do Estado. Além disso, sua vitória deve fortalecer a extrema-direita em todo o mundo, com prováveis consequências para as próximas eleições brasileiras.
“Talvez o Trump não consiga fazer tudo, mas com maioria no Senado e na Câmara, há grandes chances de ele conseguir aprovar seus projetos sem grande resistência. Em 2025, a política externa deve se concentrar em três grandes temas: a guerra entre Ucrânia e Rússia, o conflito no Oriente Médio e a relação dos EUA com a China. Para o Brasil, resta redobrar o pragmatismo e, se necessário, corrigir a rota de sua política externa a fim de contornar eventuais dificuldades que os Estados Unidos venham a colocar em termos comerciais, principalmente”, concluiu Goulart.
Reconhecimento brasileiro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou o presidente eleito dos Estados Unidos pela vitória no pleito. Ao defender o respeito ao resultado eleitoral, o presidente brasileiro desejou sorte e sucesso ao futuro governante dos EUA.
“Meus parabéns ao presidente Donald Trump pela vitória eleitoral e retorno à presidência dos Estados Unidos. A democracia é a voz do povo e ela deve ser sempre respeitada. O mundo precisa de diálogo e trabalho conjunto para termos mais paz, desenvolvimento e prosperidade. Desejo sorte e sucesso ao novo governo”, disse Lula por meio das redes sociais.
Recentemente, Lula havia manifestado preferência pela candidata Kamala Harris. Segundo ele, uma vitória da candidata democrata resultaria em fortalecimento da democracia.
O novo Congresso do país reúne-se no dia 6 de janeiro de 2025 para atestar o novo presidente. E Donald Trump toma posse em 20 de janeiro.
Aos 78 anos, Donald Trump é o homem mais velho a ser eleito para o cargo. Esse será o último mandato dele como presidente dos Estados Unidos, já que a Constituição americana só permite que uma pessoa seja eleita presidente duas vezes.
*Com informações da Agência Brasil
Escrito por: Redação