Em livro, prêmio Nobel de Economia destaca dois modelos distintos para tomadas de decisões
São diversas as obras literárias com cinco ou 10 anos de “idade” nas áreas de Gestão e Desenvolvimento Pessoal que mantêm suas importâncias até hoje. Ainda que diversas teses nestes segmentos sejam apresentadas anualmente, algumas ideias permanecem altamente atualizadas e relevantes.
É o caso do livro “Rápido e devagar: duas formas de pensar” (Editora Objetiva, 608 páginas, R$ 75), publicado no Brasil inicialmente em 2012, cujas ideias permanecem extremamente atuais. Escrito pelo israelense Daniel Kahneman, professor de Psicologia da Universidade de Princeton e de Relações Públicas da Woodrow Wilson School of Public and International Affairs, o livro leva os leitores a uma excepcional viagem pela mente humana com o objetivo de explicar duas formas essencialmente distintas de pensar.
Uma é rápida, intuitiva e emocional. A outra é mais lenta, deliberativa e lógica. Uma das principais virtudes de Kahneman é não tratar nenhuma das duas formas como certa ou errada. Trata-se da exposição de duas formas distintas, porém válidas, de chegar a decisões e avaliar cenários nas vidas pessoal e profissional.
“A distinção entre pensamento rápido e devagar tem sido explorada por inúmeros psicólogos ao longo dos últimos 25 anos”, afirma o autor, que descreve o formato dos sistemas de pensamento a partir de uma metáfora com dois agentes no livro, chamados Sistema 1 e Sistema 2, que produzem respectivamente o pensamento rápido e o lento.
“Falo das características de pensamento intuitivo e do deliberado como se fossem traços e disposições de dois personagens em sua mente. No retrato que emerge da pesquisa recente, o Sistema 1, intuitivo, é mais influente do que sua experiência lhe diz que é, e é o autor secreto de muitas das escolhas e julgamentos que você faz”, explica Kahneman. “A maior parte deste livro é sobre as operações do Sistema 1 e as influências mútuas entre ele e o Sistema 2”, completa.
Autor premiado
Ainda que tenha formação e atuação como psicólogo, o autor é também amplamente reconhecido por sua atuação no campo econômico. Graças aos seus trabalhos na área, foi agraciado em 2002 com o Prêmio Nobel de Economia. Seu livro “Rápido e devagar: duas formas de pensar” é uma de suas obras mais conhecidas internacionalmente.
Diferentemente de boa parte dos livros atuais de gestão e de autodesenvolvimento, a obra de Kahneman é extensa, superando 600 folhas de conteúdo. Não é uma leitura simples, já que o texto por vezes se torna muito técnico e voltado à pesquisa acadêmica de modo geral. Para minimizar a parte técnica, o autor busca dar exemplos, inclusive de sua atuação. O livro é dividido em cinco partes.
“A parte 1 apresenta os elementos básicos de uma abordagem de dois sistemas para o julgamento e a escolha. Elabora a distinção entre as operações automáticas do Sistema 1 e as operações controladas do Sistema 2, e mostra como a memória associativa, o âmago do Sistema 1, continuamente constrói uma interpretação coerente do que está acontecendo em nosso mundo a qualquer instante. Tento dar uma ideia da complexidade e riqueza dos processos automáticos e muitas vezes inconscientes que subjazem ao pensamento intuitivo e de como esses processos automáticos explicam as heurísticas de julgamento. Um dos objetivos é apresentar uma linguagem para pensar e falar sobre a mente”, explica Kahneman.
A segunda parte explora o que é considerado um grande enigma para estudiosos do tema. Por que é tão difícil para nós pensar estatisticamente? O autor explica que o ser humano, de forma geral, pensa com facilidade de forma associativa, metafórica e até mesmo causal. No entanto, pensar em estatísticas requer pensar sobre muitas coisas de uma vez, algo que, de acordo com o autor, o Sistema 1 não está projetado para fazer.
“As dificuldades do pensamento estatístico contribuem para o principal tema da parte 3, que descreve uma limitação desconcertante de nossa mente: nossa confiança excessiva no que acreditamos saber, e nossa aparente incapacidade de admitir a verdadeira extensão da nossa ignorância e a incerteza do mundo em que vivemos”, explica o professor.
De acordo com ele, somos inclinados a superestimar o quanto compreendemos sobre o mundo e subestimar o papel do acaso nos eventos. Essa superconfiança é alimentada pela certeza ilusória da percepção tardia.
Na sequência, na parte 4 do livro, o autor estabelece um diálogo com a disciplina da economia sobre a natureza da tomada de decisões e sobre a pressuposição de que os agentes econômicos são racionais. “Essa seção do livro fornece uma visão corrente, informada pelo modelo de dois sistemas, dos conceitos-chave da teoria da perspectiva”, completa o autor.
Por fim, na parte 5, o autor aborda a pesquisa recente que introduziu uma distinção entre “dois eus”: o eu que vivencia a experiência e o eu que se lembra, os quais não partilham os mesmos interesses.
“Por exemplo, podemos expor as pessoas a duas experiências dolorosas. Uma dessas experiências é estritamente pior do que a outra, porque é mais duradoura. Mas a formação automática de lembranças – característica do Sistema 1 – tem suas regras, que podemos explorar de modo que o pior episódio deixe uma lembrança melhor. Quando as pessoas posteriormente escolhem que episódio repetir, são, naturalmente, guiadas pelo eu recordativo e se expõem (seu eu experiencial) a uma dor desnecessária. A distinção entre os dois eus é aplicada à medição de bem-estar, onde descobrimos mais uma vez que o que torna o eu experiencial feliz não é exatamente a mesma coisa que satisfaz o eu da lembrança. Como dois eus dentro de um único corpo podem perseguir a felicidade suscita algumas questões difíceis, tanto para os indivíduos como para as sociedades que veem o bem-estar da população como um objetivo das políticas públicas”, explica.
Trata-se de um livro interessante, que expõe formas distintas de pensar, sem determinar a validade exclusiva de uma ou de outra. Necessário considerar apenas que a escrita do autor não é das mais fáceis, voltada essencialmente a um formato acadêmico.
Escrito por: Redação