Se o ano de 2018 teve início como um dos mais promissores no que diz respeito à expectativa da indústria e dos consumidores em relação à recuperação da economia brasileira, uma notícia amplamente divulgada no dia 11 de janeiro funcionou como um verdadeiro balde de água fria. Na ocasião, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s (S&P) rebaixou o Brasil para três níveis abaixo do grau de investimento com perspectiva estável. O que, de fato, significa essa decisão?
Até que ponto o rebaixamento interfere na economia do País?
Para entender a notícia é preciso, de início, entender todos os conceitos atrelados à decisão da agência. A classificação de risco de um país é determinada por agências estrangeiras consideradas imparciais, que buscam avaliar o cenário financeiro de cada nação de modo a demonstrar qual é a confiança dos investidores internacionais em sua economia.
As notas atribuídas a cada país servem como referência para os juros de títulos públicos, que representam o custo para que o governo pegue dinheiro emprestado de investidores. Não são apenas os países que recebem esse tipo de nota. As empresas que emitem títulos no mercado financeiro também são avaliadas pelas agências de modo a receberem uma classificação que possa balizar possíveis empréstimos realizados por elas.
Abaixo do grau de investimento está o grau especulativo. Quanto mais a nota do país diminui, maior será a chance de haver calote no pagamento da dívida pública desse país. Isso aos olhos do mercado internacional, que irá conceder esse tipo de crédito. Da mesma forma, quando um país consegue manter crescente sua nota avaliativa, investimentos estrangeiros serão atraídos por esta mesma nação.
É por isso que o grau de investimento é tão buscado pelos países em desenvolvimento. O Brasil alcançou esta marca em 2008, quando a própria S&P incluiu o País nessa posição, sendo seguida posteriormente por outras agências. Era justamente a recente época de ouro brasileira, com a economia crescendo consideravelmente e os principais índices do País conquistando altas históricas.
O cenário negativo começou a aparecer em 2015, quando o País se viu mergulhado em uma crise política e econômica. Na ocasião, a S&P retirou o grau de investimento brasileiro e concedeu perspectiva negativa, decidindo rebaixar novamente o índice em fevereiro de 2016. A decisão mais recente da agência coloca a nota brasileira três graus abaixo do grau de investimento. A agência, entretanto, manteve estável o outlook (perspectiva) da nota, o que significa que não poderá rebaixar o País novamente antes da próxima reavaliação, que deverá levar ao menos seis meses.
Posicionamento da Fazenda
Após o anúncio da S&P, o Ministério da Fazenda buscou “colocar panos quentes” na situação, mas reforçou a necessidade da aprovação das reformas estruturais pelo Congresso. A pasta divulgou nota e informou que o governo brasileiro está comprometido com o ajuste fiscal e espera reverter a situação.
“O governo reforça seu compromisso em aprovar medidas como a reforma da Previdência, tributação de fundos exclusivos, reoneração da folha de pagamentos, adiamento do reajuste dos servidores públicos, entre outras iniciativas que concorrem para garantir o crescimento sustentável da economia brasileira e o equilíbrio fiscal de longo prazo”, esclareceu o Ministério, que voltou a cobrar empenho dos parlamentares para a aprovação das reformas.
“Sempre contamos com o apoio e com a aprovação das medidas necessárias para o País pelo Congresso Nacional e temos certeza que o mesmo continuará a trabalhar em favor das reformas e do ajuste fiscal fundamentais para o Brasil”, completou.
Posteriormente, em entrevista coletiva, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que a elevação da nota de risco do Brasil é uma questão de tempo. Meirelles voltou a mostrar confiança na aprovação da reforma da Previdência e das medidas de ajuste fiscal.
“O Congresso tem mostrado que tem aprovado as reformas fundamentais no País. Aprovou o teto de gastos, a reforma trabalhista, a Lei das Estatais e a TLP [Taxa de Longo Prazo]. Outras medidas, como o cadastro positivo e a duplicata eletrônica, estão em aprovação. Existe um histórico de aprovação. Essas reformas vão continuar ocorrendo, e a perspectiva de aumento do rating é questão de tempo. Isso foi levado em conta na melhora da perspectiva [da nota do Brasil pela S&P] de negativa para estável”, disse o ministro.
Para o ministro, a reação calma do mercado no dia seguinte à notícia de rebaixamento da nota evidencia que a economia brasileira está em um momento de recuperação. “Um ponto importante, que parece ser digno de ênfase neste momento, é a reação da economia no curto prazo, dos indicadores de mercado que reagem na mudança do rating no Brasil. Hoje (12/01), o dólar caiu um pouquinho, os juros de longo prazo caíram um pouquinho, e a bolsa continua estável”, complementou.
Outro ponto bastante destacado pelo ministro em suas declarações é que é preciso calma para não “transformar o rebaixamento da nota em um grande evento político”. Para isso, Meirelles fez questão de enfatizar que a decisão da agência foi algo pontual.
“A agência faz o trabalho dela e nós fazemos o nosso. Não se deve dar um peso excessivo [ao rebaixamento], transformando isso em um movimento político. A questão de upgrade ou downgrade é pontual, um importante sinalizador, mas não é um grande evento político do País. Ao contrário, [houve uma] observação de que eles vão aguardar a aprovação de todas as medidas relevantes do ponto de vista fiscal. Nós temos nossa agenda de trabalho e na medida em que isso vai funcionando, as agências vão reconhecendo no devido tempo”, disse.
Para Antônio Bento, CEO da IBS-Energy, com 30 anos de experiência em gestão empresarial e governança corporativa, o cenário político foi o que mais motivou o rebaixamento e não o econômico.
“A agência colocou em dúvida se a classe política dominante será capaz de se unir para promover as reformas que o País tanto necessita, ainda que ninguém espere isso neste ano eleitoral. Minha leitura ainda é que a economia dá sinais reais de se descolar da política. Porém, parece que a política insiste em não se descolar da economia”, afirmou Bento, que mostrou otimismo também em relação à recuperação do setor automotivo.
“Embalada por um crescimento das exportações, a indústria automotiva fecha 2017 com crescimento ao redor de 24% com relação a 2016 e continuará crescendo em 2018. Com isso, há razões de sobra para otimismo. Vamos continuar crescendo!”, completou.
Recuperação
Apesar de ter funcionado como um verdadeiro balde de água fria para todos aqueles que acreditavam na recuperação da economia brasileira, o rebaixamento da nota pela S&P foi seguido de notícias que ajudaram a mitigar qualquer estrago no ambiente econômico do País.
Alguns dias após o rebaixamento, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou que a utilização média da capacidade instalada da indústria brasileira foi de 64% em dezembro de 2017. Para a entidade, o número representa uma trajetória de recuperação para a indústria, já que foi superior ao do mesmo mês de 2016 (63%), e de 2015 (62%).
A utilização média da capacidade instalada mede a proporção de uso da infraestrutura disponível nas fábricas. Para a CNI, o resultado de dezembro do ano passado sugere “a manutenção do processo de recuperação da indústria no encerramento do ano”. Isso porque, de acordo com a entidade, é normal que a produção caia em dezembro, época de fim das encomendas para festas de fim de ano.
Outro importante dado divulgado pela CNI diz respeito à expectativa dos empresários com o ano que se inicia. De acordo com a Confederação, por meio de uma sondagem industrial realizada com os empresários no País, foi possível verificar que a intenção da indústria é manter seus quadros de funcionários inalterados em 2018.
Conforme explicou a Agência Brasil em reportagem, a expectativa em relação ao número de empregados ficou em 50,2 pontos, em uma escala de 0 a 100, em que mais de 50 representa expectativa de aumento do número de empregados, e menos de 50, de redução. No mesmo período de 2017, o índice estava em 46,4 pontos.
Já a expectativa dos empresários quanto à demanda ficou em 56,6 pontos, à frente dos 51,9 pontos de janeiro de 2017. Graças a esse ambiente positivo verificado pelos executivos, cresceu também a intenção de investir em 2018. O índice relativo a este ponto chegou ao maior valor desde maio de 2014, com 53 pontos. No caso das grandes indústrias, o número ficou em 61,5 pontos.
Posteriormente, dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) reforçaram as informações divulgadas pelas demais entidades. SPC Brasil e CNDL informaram que a intenção dos empresários em investir em seus próprios negócios aumentou em dezembro de 2017 na comparação com o mesmo período do ano anterior, atingindo 35,1 pontos, em uma escala que vai de zero a 100.
Ainda assim, as entidades recomendam cautela na análise dos números. Isso porque o número de empresários que pretendem investir ainda é considerado baixo (29%). Para aqueles que não pretendem investir, 48% não o farão por não considerarem necessário, enquanto 26% entendem que ainda pesa a percepção de que o País não saiu da crise.
Entre os que pretendem investir em 2018, as medidas mais comuns serão a reforma da empresa (27%), a ampliação de estoque (23%), a aquisição de máquinas e equipamentos (20%), investimentos em mídia e propaganda (13%) e a ampliação de portfólio (13%).
De fato, os números têm contribuído para a percepção de que o cenário brasileiro tem melhorado. Os empresários estão mais otimistas e esse sentimento certamente chegará aos consumidores. Notícias como a do rebaixamento da nota brasileira pela S&P servem justamente para colocar um contrapeso em um cenário por demais otimista. É preciso lembrar, por exemplo, que 2018 é um ano eleitoral e isso poderá trazer turbulências ao cenário econômico do País, atrapalhando justamente esse movimento de crescimento verificado nos últimos meses.
A cautela é necessária, mas os índices nos permitem acreditar em um horizonte mais azul.
*Com informações da Agência Brasil.
Escrito por: Redação