Mudanças de mercado dos últimos anos fizeram com que as empresas repensassem o conceito de escalabilidade
Dentre as diversas mudanças vivenciadas no mercado nos últimos anos, é possível destacar que a adaptação das empresas aos diferentes cenários impostos (isolamento total, isolamento parcial, venda pelo meio online) teve de ocorrer praticamente em tempo real. Muito do que foi escrito em manuais de gestão e administração foi simplesmente descartado em alguns casos, diante de metrópoles que passaram dezenas de dias em isolamento severo.
Quem sobreviveu a este período (cujas dificuldades ainda persistem, naturalmente) certamente deve se considerar vencedor. E é chegado o momento de, após distanciar-se de forma relevante da tormenta, olhar para o horizonte com olhos mais promissores e otimistas.
Nesse sentido, vale a pena abordar um conceito que estava relativamente esquecido em discussões sobre gestão e administração. Afinal, como pensar em escalabilidade do negócio em meio à incerteza de abrir ou não as portas na semana seguinte?
Um negócio escalável representa, muitas vezes, a oportunidade de associar a empresa a conceitos como inovação e crescimento sustentável, atraindo até mesmo investimentos em diferentes modelos de captação. Desenvolver uma atuação escalável significa garantir que a empresa sustente ou até mesmo melhore seu desempenho mesmo em um cenário de aumento relevante de vendas.
O crescimento das vendas até pode, num primeiro momento, representar o sonho de todo e qualquer empresário. No entanto, se esse crescimento ocorre sem qualquer base, sem condições que mantenham o negócio sustentável, as chances de que as operações passem a ser menos eficientes são grandes. Menos eficiência equivale a menor lucro, indo certamente na contramão do que se esperava com o aumento nas vendas.
A escalabilidade, portanto, representa importantes ganhos para a empresa já que permite a ela alçar voos mais altos sem que para isso seja necessário passar por uma grande reformulação (o que representa custos) ou diminuir sua eficiência operacional (reduzindo sua margem de lucro como consequência).
No livro Mestres da Escala – As grandes ideias que transformaram pequenos negócios em sucessos globais, os autores Reid Hoffman, June Cohen e Deron Triff destacam conceitos que aprenderam através de longas e profundas conversas com pessoas que escalaram seus negócios. De acordo com eles, foi possível descobrir algumas verdades “pouco intuitivas” sobre a escalabilidade, tais como:
- Geralmente, as melhores ideias e as mais escaláveis são as que parecem, num primeiro momento, menos plausíveis;
- Encontrar resistência no começo da jornada é algo que pode ser encarado como positivo;
- Receber feedbacks das pessoas certas no começo da empreitada ajuda o empreendedor/executivo de modo inimaginável, aperfeiçoando suas ideias;
- Fazer coisas que não são escaláveis (especialmente em estágios iniciais) pode preparar o empreendedor para um processo acentuado de escala mais à frente;
- Nada o impede de aceitar a realidade e corrigir o rumo se notar erros ao longo do caminho.
Importância do digital
Quando se observam os principais valores e orientações difundidos por especialistas para empresários que desejam escalar seu negócio, uma característica é comum a todos os discursos: a importância do digital nesse processo.
De fato, é quase impossível pensar em estratégias bem sucedidas de escalabilidade atualmente que não considerem a presença do digital entre seus ativos mais importantes. Isso porque uma das ideias da escalabilidade é tornar o negócio mais receptivo à sua expansão, sem que saiba, por exemplo, quando (e se) ela ocorrerá.
Uma das orientações relacionadas à escalabilidade diz respeito ao uso de soluções armazenadas na nuvem. Isso passou a ser uma realidade para diversas empresas que no pré-pandemia não tinham um arquivo sequer em nuvem. O uso da nuvem permite ao negócio ampliar seu alcance operacional, gerando segurança e praticidade para que colaboradores possam contar até com mais soluções do que teriam se estivessem simplesmente num escritório fechado.
Diversas empresas – dos mais variados portes – oferecem atualmente os serviços de cloud computing, o que fez com que seus preços fossem sensivelmente reduzidos ao longo dos últimos anos. Adotar o sistema, no entanto, não deve representar uma atitude isolada da empresa. O investimento em segurança de dados é essencial para evitar problemas indesejados que podem comprometer seriamente a operação de uma marca.
O fomento à área de Tecnologia de Informação deixou de ser opcional para empresas que utilizam o ambiente online para armazenar e tratar seus dados – sejam eles internos, sejam relativos aos próprios clientes. Afinal, ninguém quer enfrentar sanções relacionadas à Lei Geral de Proteção de Dados por questões que poderiam ser facilmente prevenidas.
O uso do cloud computing também está relacionado à menor dependência do espaço físico. Ao promover um modelo de trabalho home office de maneira forçada, a pandemia obrigou muitas empresas a repensarem suas reais necessidades sobre os espaços que ocupavam.Atividades administrativas e funções que poderiam ser facilmente desempenhadas em casa, ou até mesmo no modelo híbrido, mudaram radicalmente a demanda das empresas por espaços físicos.
Pode não parecer, mas a menor dependência do espaço físico contribui muito para estratégias de escalabilidade nas empresas. Afinal, como pensar em escalar um negócio se qualquer aumento de demanda representa gastos e mais gastos com estoque, transporte, logística etc.? Escalar um negócio apostando em espaços físicos é extremamente inviável já que a proposta aqui seria justamente estar pronto para aumentos de demanda a qualquer momento. Nesse sentido, é muito mais fácil se adaptar em um ambiente online, no qual aumentar ou diminuir a demanda não representam grandes desafios imediatos.
Características do negócio escalável
A Endeavor, rede formada por empreendedores, entende que, para ser escalável, uma empresa deve apresentar um modelo de atuação com três características essenciais:
- O modelo deve ser ensinável: em outras palavras, seu negócio (ou o core business do seu negócio) não pode depender apenas da sua atuação ou de determinado colaborador para funcionar. Quando falamos em “estar preparado para crescer” estamos falando da possibilidade de ampliar a produção ou o serviço sem que para isso os novos colaboradores precisem passar por intensos e complexos treinamentos, com curvas de aprendizagem de meses.
Se o processo não for rapidamente “ensinável”, perde-se a oportunidade de crescer fácil e eficientemente em um momento de maior demanda.
- O modelo deve ser valioso: seu produto, ou o serviço que oferece, deve ser valioso. Caso contrário, em um momento de aumento de demanda seu produto poderá facilmente se perder em meio à concorrência. Ter um negócio escalável significa que seu produto/serviço permanece valioso, mesmo diante de uma mudança repentina tão significativa (não apenas na demanda, mas consequentemente na escala de produção).
- O modelo deve ser replicável: nesse caso, não se trata de replicar o modelo de negócio ensinando-o a outra pessoa, mas de replicar sua atuação em maior escala, sem que haja perda de eficiência e também de lucro nesse processo. Ou seja, diante de um aumento súbito de demanda, você consegue ampliar a escala de seu negócio e gerar o mesmo valor (através dos mesmos procedimentos) ao primeiro e ao último consumidor que atender? Isso é essencial para a escala ocorra de forma sustentada, equilibrada e qualificada.
Bons exemplos
O livro Mestres da Escala tem como origem o podcast Masters of Scale, criado e apresentado por Reid Hoffman desde 2017. Mais de 80 episódios já foram produzidos, a partir de centenas de horas de conversa com os empreendedores mais admirados do mundo. Uma das principais vantagens da obra é trazer aos leitores experiências riquíssimas sobre empresas que decidiram arriscar e escalar seus negócios. Não se trata de um “tiro no escuro”, conforme destacam os autores, mas de estruturar as bases de seu negócio de modo que o risco seja muito menor ao ampliar sua escala de produção.
O livro também trata de questões práticas como a obtenção de financiamento e a gestão dos desafios do crescimento rápido. Não são raros os casos em que determinado setor da empresa se estrutura para escalar com qualidade (vendas, por exemplo), mas esse movimento não é acompanhado por outros setores primordiais para seu funcionamento (logística e transporte, por exemplo).
Um dos conceitos que, de fato, precisa cair por terra quando pensamos em escalar um negócio diz respeito à ideia de que, para isso, seria necessário investir muito dinheiro, contratar diversos novos colaboradores e contar com profissionais que necessariamente tenham passado por startups e afins. Escalar um negócio não pode ser confundido como uma expansão “pura e simples”. Os dois movimentos têm suas dificuldades, mas a ideia da escalabilidade é justamente fazer mais com menos. Ou seja, ampliar as entregas e/ou o serviço sem que para isso seja necessário promover investimentos ou contratar.
Parte das empresas que falham em escalar seu negócio o fazem porque não promovem uma correta integração entre todos os seus times e não se dedicam a conhecer as particularidades, fortalezas e fraquezas de seu negócio. Quando a demanda aumenta, aquelas pequenas rachaduras até então imperceptíveis crescem e podem chegar a um estágio que impede qualquer tipo de reparo.
Vale também dedicar tempo e atenção a um planejamento estratégico que considere diferentes tipos de cenários. Escalar um negócio não significa improvisar ou contar com a sorte. Ao contrário, quanto mais sua empresa e seus colaboradores estiverem preparados, melhor será o aproveitamento da demanda repentina que chega. Pensar de forma estratégica e antecipar cenários significa antever problemas e consequentemente os ajustes que são necessário. O aumento repentino na demanda pode ser direcionado às vendas online, às vendas em balcão ou em ambos os ambientes. E as soluções para cada um dos cenários será diferente.
Portanto, vale pensar na escalada de seu negócio através das características citadas. Afinal, sobreviver aos impactos econômicos da pandemia foi o primeiro desafio. Agora, é preciso coragem e estrutura para ampliar e qualificar sua atuação frente à concorrência.
Escrito por: Redação