Em entrevista à Mercado Automotivo, Delfim Calixto, vice-presidente da divisão Automotive Aftermarket da Bosch América Latina, fala sobre as principais tendências do setor automotivo para os próximos anos. Confira a seguir:
Mercado Automotivo – Especialistas do mercado automotivo falam em duas tendências primordiais para os próximos anos no Brasil e no mundo. Gostaria que falasse sobre a possibilidade de redução de acidentes de tráfego a partir da automatização dos carros. Esse cenário deverá necessariamente representar uma queda na demanda dos serviços de oficinas e de autopeças?
Delfim Calixto – Os veículos autônomos funcionam prevendo os mais variados tipos de comportamentos no trânsito e, a partir destes dados, pode realizar medidas necessárias para amenizar ou até mesmo evitar os acidentes. “Salvar vidas” é um dos principais objetivos da automatização. No entanto, ainda precisaremos de algum tempo para termos um veículo 100% autônomo. Temas como infraestrutura e legislação precisam ser resolvidos antes de termos um veículo 100% autônomo. Mas este é um caminho sem voltas e pouco a pouco vemos novas tecnologias sendo incorporadas em todos os veículos, até mesmo nos chamados “populares”.
É certo que com menos acidentes teremos uma redução nos serviços, especialmente funilaria e pintura. Mas é muito importante comentar que o mercado de oficinas e autopeças precisará se atualizar frente as novas tecnologias com o intuito de ampliar a gama de serviços que hoje oferecem para o mercado. A experiência do usuário, a conectividade e a Internet
das Coisas estão entre os temas que estarão cada vez mais em alta e que o setor de reposição automotiva terá que estar familiarizado.
MA – Quando se fala em automatização do veículo, muitos brasileiros ainda avaliam como algo distante, fora da nossa realidade. Isso é um mito ou é uma verdade? Estamos, de fato, tão atrasados na comparação com os mercados dos EUA e da Europa no quesito carros automatizados?
DC – Os carros 100% autônomos são algo ainda distante da realidade brasileira e por diferentes fatores que vão desde a infraestrutura das cidades, sinalização das ruas e estradas para se comunicarem com esses veículos, legislação, como já comentei anteriormente. Para que a condução totalmente autônoma se torne realidade, será necessário que ocorra a integração de carros e cidades inteligentes, por exemplo. Estamos falando de veículos que, em sua maioria, ainda estão em fase de teste e desenvolvimento e não estão disponíveis para produção em massa.
Entretanto, estamos observando um crescimento de veículos no mercado nacional equipados com sistemas de assistência ao condutor, como a frenagem automática de emergência que freia o carro ao detectar um objeto ou pessoa à frente, ou então sistemas de estacionamento que manobram o carro sem a interferência humana, piloto automático que permite que o motorista determine uma velocidade enquanto está trafegando por uma rodovia, sistema de assistência em faixa que auxilia os motoristas a manterem o veículo dentro dos limites da faixa, usando um sensor de vídeo que detecta as faixas à direita e à esquerda do carro, entre outras soluções. Como pode ver, estamos caminhando para um trânsito mais seguro, mesmo que seja numa velocidade menor em relação a alguns países europeus, EUA, China e Japão. Estamos também no caminho da automatização.
MA – Uma segunda tendência é o aumento do uso compartilhado de carros, inclusive a partir da alta no número de profi ssionais trabalhando com transporte por aplicativo (e alternando seu uso). O senhor entende que isso abrirá maior demanda por manutenção dos veículos, como com a substituição de peças por desgaste?
DC – Com certeza! O compartilhamento de veículos poderá reduzir a quantidade de veículos rodando, porém, impactará
a quantidade de quilômetros rodados. E isto é o mais importante para garantir maior demanda por manutenção. Especialmente os veículos de transporte por aplicativo, estes necessitam de mais cuidado na manutenção, pois a quantidade de quilômetros rodados por dia tende a ser maior, sem contar com o desgaste de alguns componentes devido ao fluxo de tráfego nos grandes centros urbanos. E aqui temos que mencionar a importância da manutenção preventiva!
No entanto, qualquer veículo, seja ele de uso para transporte por aplicativo ou não, é importante fazer o cálculo de custo
por quilômetro rodado. É preciso sempre ter controle sobre a quilometragem e garantir que a manutenção preventiva
esteja em dia.
MA – De que forma as ofi cinas e os lojistas podem trabalhar para fidelizar esse tipo de consumidor (que compartilha e/ou trabalha com seu veículo em transporte por aplicativo)? Gostaria que falasse também sobre o suporte que a Bosch oferece às ofi cinas da rede Bosch Service para contratos B2B com frotistas.
DC – A experiência do usuário será cada vez mais fundamental em qualquer ramo de atuação. O consumidor não está apenas em busca do melhor preço, ele busca serviços diferenciados, mas também por conveniência, flexibilidade de horários, segurança, profissionalismo, conectividade (a pandemia mostrou o crescimento das vendas de produtos e serviços em plataformas on-line). Enfim, o setor de reparação precisa estar atento a essas mudanças comportamentais e adaptar seus serviços para atender esse usuário cada vez mais exigente.
A comunicação com as oficinas e lojistas é extremamente importante para os negócios da Bosch. Procuramos apoiar as oficinas e seus profissionais com suporte completo e oferecer muito mais que soluções em peças, serviços, equipamentos e treinamentos, mas também incluindo sistemas para a gestão do negócio, auditorias de qualidade e o mais importante, oferecemos a marca Bosch como grande diferencial para o negócio.
A rede Bosch Service completa 100 anos de existência em 2021 e é, sem dúvida, um dos nossos principais pilares
estratégicos. O nosso objetivo é que as oficinas mecânicas e os profi ssionais da reparação possam confi ar em nossa
marca e nos selecionar como seu principal parceiro.
MA – Como o senhor avalia o investimento atual em tecnologia no setor de reposição automotiva? Melhorou nos últimos anos ou ainda falta muito para atingirmos patamares de países mais desenvolvidos?
DC – O setor automotivo é uma área em constante evolução tecnológica e o mercado de reparação tem que estar atento
a essas mudanças e se preparar tanto na capacitação da mão de obra quanto na aquisição de equipamentos adequados para fazer o correto diagnóstico e a manutenção dos veículos, especialmente quando termina o período de garantia de fábrica. Acredito que o mercado local está preparado para atender a frota atual e há inclusive oficinas já preparadas para atender os veículos híbridos e elétricos.
MA – Pensando no fato de o Brasil ser um país de tamanho continental, o que o senhor avalia como mais urgente para os distribuidores de autopeças: a reforma tributária ou um profundo investimento em infraestrutura nacional?
DC – Pergunta difícil! Sem dúvida ambos os temas fazem parte de uma agenda importante para o desenvolvimento do País. Há muito tempo se fala em Reforma Tributária no Brasil e, apesar do anseio dos empresários para que a reforma traga uma redução de carga tributária, avaliamos que dois pontos são os mais importantes do que a reforma em si: a) simplificação dos tributos e b) um cenário legal claro.
A simplificação permitiria que os empresários tivessem menos custos administrativos para realizar o pagamento dos tributos, que é uma redução indireta, mas esta redução é muito bem-vinda. Atualmente temos um cenário extremamente complexo para apurar, pagar e declarar os tributos. No caso do ICMS, por exemplo, é preciso acompanhar a legislação de 27 estados.
Já um cenário legal claro, sem diversas interpretações da legislação e sem necessidade de recorrer ao judiciário para definir qual o conceito que a lei está considerando, traria mais segurança aos empresários que poderiam focar no seu negócio ao invés de ter que acompanhar as diferentes interpretações que o Fisco pode ter em relação ao que empresa/indústria aplicou.
MA – Qual é a expectativa da Bosch para os próximos 3 anos de atuação no Brasil? O quanto a pandemia de Covid-19 impactou os planos da empresa?
DC – A pandemia assustou a todos, especialmente nos primeiros dois meses em que os negócios foram mais afetados. Tivemos que nos adaptar às necessidades e demandas do mercado, buscando novos meios de contato com os clientes e repensamos nossa forma de fazer negócio, ou seja, tivemos que aprender com esse novo cenário. No entanto, alguns setores reagiram muito rápido e, a partir de junho, observamos uma retomada dos negócios inclusive a níveis superiores aos do ano anterior. Estamos crescendo no mercado de reposição e nossa expectativa é fechar 2020 com um faturamento superior ao de 2019, que já tinha sido um excelente ano para nós.
Para os próximos 3 anos, estamos otimistas, porém, cautelosos! Creio que aprendemos muito este ano e estamos preparados para os desafios que estão por vir!
MA – Após um ano completamente atípico e difícil, que mensagem o senhor gostaria de deixar aos colaboradores
da Bosch no Brasil?
DC – Apenas um agradecimento a todos os colaboradores, principalmente aos que atuaram na linha de frente durante
os primeiros meses de isolamento social. A dedicação, o esforço e o profi ssionalismo de toda a equipe foram o
grande diferencial. A retomada dos negócios da empresa não seria possível sem o apoio e dedicação de cada um.
Muito obrigado!
MA – Qual é o peso do fator “inovação” para a Bosch atualmente? Em 2019, a empresa registrou o terceiro maior volume de pedidos de patentes de acordo com dados do Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).
DC – É um orgulho termos esse tipo de reconhecimento, pois mostra que estamos no caminho certo. A inovação faz parte do DNA da empresa desde a sua fundação e somos uma das empresas líder global no fornecimento de tecnologias e serviços. Temos o compromisso de incentivar o desenvolvimento de novas tecnologias nos mercados em que atuamos. Anualmente a Bosch investe cerca de 3.5% do seu faturamento na América Latina em P&D e conta com três Centros de Pesquisa e Desenvolvimento no Brasil – dois em Campinas e um em Curitiba. A Bosch é reconhecida mundialmente por suas importantes inovações nos setores em que atua, como os lançamentos pioneiros de produtos como: Magneto de alta tensão (1902), Injeção de diesel em veículos de passageiros (1927), ABS-Sistema de Frenagem Antibloqueio (1978), Air Bag (1980), ESP-Programa Eletrônico de Estabilidade (1995), Start Stop (2007), tecnologia de injeção flex fuel, entre outros.
No setor automotivo, a Bosch está presente em veículos de todas as montadoras. Inovação para a vida sempre foi nosso objetivo e agora não é diferente. Toda crise gera oportunidades e para isto a Bosch está revisando alguns conceitos mercadológicos por todos os setores industriais, especialmente o automotivo, atuando fortemente no tema de eletrificação, redução de emissões, veículo autônomo, conectividade e digitalização, realizando parcerias estratégicas com empresas privadas, universidades e institutos de pesquisa.
MA – Um dos efeitos da pandemia foi aumentar o volume de compras on-line. A Bosch passou a disponibilizar suas autopeças no Mercado Livre, uma das maiores plataformas para compras no Brasil. A empresa avalia esta como uma tendência que deverá durar mesmo após a pandemia?
DC – O e-commerce já é uma realidade mundial e está ganhando cada vez mais força no Brasil. Os comportamentos de consumo mudaram e a internet está se tornando a principal forma de compras, por isso, é importante estar presente de forma ativa nos canais digitais. Além do Mercado Livre, também estamos atuando na Amazon. Antes de ingressar no e-commerce, é preciso planejamentos estratégicos específicos para as mais variadas plataformas que existem, de forma a oferecer não somente o produto como também a qualidade e uma experiência de compra agravável para o usuário, informando dados técnicos e confi áveis, ofertando produtos de qualidade e atendimento rápido e eficiente, especialmente quando se trata do setor automotivo.
Nosso objetivo é cada vez mais estreitar o relacionamento com o usuário fi nal e investir nos canais digitais, ampliando
nossa oferta de produtos e serviços para atender e capacitar os profissionais da área e gerar demanda para nossos clientes.
Escrito por: Redação