Governo tem a expectativa de aprovar projeto que prevê mudanças sensíveis na administração pública
Diante de tantas notícias negativas referentes à economia nacional, com origem na pandemia de Covid-19 e turbulências nos mercados internacionais, o governo brasileiro tem a esperança de aprovar uma importante reforma no Congresso. O problema, entretanto, diz respeito ao prazo em que o projeto poderá ser avaliado. O objetivo, de acordo com Brasília, é reduzir gastos imediatos e futuros, mas a discussão sobre a aprovação do projeto certamente será extensa e envolverá uma forte disputa entre todos os congressistas.
Além da tributária, a reforma administrativa é uma das mais almejadas pelo governo federal. A mudança no âmbito administrativo já foi objeto de desejo de gestões anteriores, mas esbarrou em diversos fatores que impediram o avanço dos projetos.
Desta vez, o governo pretende pressionar o Congresso para colocar em votação o projeto e promover suas aprovações em tempo adequado. Dessa forma, no início de setembro foi enviado ao Congresso o projeto que prevê a reforma administrativa, através da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 32.
Em entrevista à Agência Brasil, o secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Wagner Lenhart, afirmou que a reforma administrativa dará ao governo maior flexibilidade e capacidade de adaptação às mudanças tecnológicas e na sociedade. Para Lenhart, a principal mudança prevista no projeto é a criação de cinco novos formatos de vínculos na administração pública:
– Vínculo de experiência (ainda com uma etapa do concurso público);
– Cargos típicos de estado (com estabilidade);
– Cargos com vínculo por prazo indeterminado;
– Vínculo por prazo determinado (substituirá a contratação temporária);
– Cargos de liderança e assessoramento (contrato por seleção simplificada e parcela de livre nomeação).
A efetivação das mudanças, no entanto, ainda depende de uma série de fatores. Além de aprovar a PEC no Congresso, o governo deverá enviar projetos de lei sobre gestão de desempenho, modernização das formas de trabalho, consolidação de cargos, funções e gratificações, arranjos institucionais, diretrizes de carreiras e ajustes no Estatuto do Servidor.
Posteriormente, na terceira fase, o governo enviará o Projeto de Lei Complementar do Novo Serviço Público, com o novo marco regulatório das carreiras, governança remuneratória, bem como direitos e deveres do novo serviço público.
Assim que tudo for concluído, as novas regras, se aprovadas, valerão para os futuros servidores civis da União, estados e municípios dos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Segundo informações da Agência Brasil, a proposta de Brasília não altera as regras para os atuais servidores, membros do Poder Judiciário (juízes, desembargadores e ministros), do Poder Legislativo (deputados e senadores) e do Ministério Público (promotores e procuradores). Esses membros somente poderão ser afetados pela reforma se o Congresso realizar mudanças no texto durante a tramitação da PEC.
Lenhart afirmou que o governo está aberto para aprimoramentos no texto pelo Congresso, mas ressaltou que espera-se uma aprovação rápida e que a PEC, quando aprovada, viabilize “a modernização da administração pública”.
“É um projeto que a gente está trabalhando há bastante tempo. Buscamos referências e colocamos no texto aquilo que entendemos que é a melhor proposição para esse movimento de transformação da administração pública. Mas sabemos que o texto pode ser melhorado e o Congresso Nacional vai fazer um debate amplo sobre isso. Esperamos que aquilo que tem de mais importante na proposta seja mantido. Estamos sempre abertos para receber aprimoramentos do texto. Nosso objetivo é que ao final deste processo a gente tenha a melhor emenda à Constituição possível, que viabilize os outros passos que fazem parte dessa jornada de modernização da administração pública”, afirma.
A polêmica, no entanto, já é grande. Diferentes categorias de servidores públicos questionam a proposta da reforma, por entenderem que ela retirará direitos e benefícios essenciais ao correto desempenho de suas funções. O secretário defende o projeto e afirma que ele não foi construído de “costas para os servidores públicos” e que garantirá condições de trabalho e salários pagos em dia, futuramente.
“Muitos servidores públicos efetivos participaram da elaboração desse texto. A gente tem conversado com as entidades representativas, mas em nível conceitual, sem entrar em detalhes. A gente não debateu sobre o texto propriamente. Conversamos com especialistas, fomos buscar referências internacionais. Esse é um projeto com grande impacto social porque objetiva melhorar o serviço público e conseguir atender melhor nas escolas, nos postos de saúde, dar segurança. E vai ser bom também para o servidor. A gente não construiu tudo isso de costas para o servidor, a gente construiu isso junto com ele. É muito importante que a gente faça esse movimento para pagar o salário em dia, para dar condições de trabalho para o servidor”, disse.
Questionado se a reforma não tirará a atratividade do serviço público futuramente, o secretário defendeu o equilíbrio. “A gente tem uma preocupação muito grande de manter a atratividade do serviço público. Precisamos trazer pessoas talentosas, com boa formação e que vão desempenhar bem a sua função. Há diversas ferramentas para manter essa atratividade. Queremos um sistema que não seja muito descolado da realidade do restante dos trabalhadores brasileiros, mas, ainda assim, seja atrativo. A ideia é não só atrair, mas reter os talentos na administração, motivá-los. Historicamente, a gestão de pessoas no serviço público da União, de estados e municípios tem sido negligenciada. Não tem tido o protagonismo que deveria ter. No mundo de hoje, o grande diferencial de uma organização bem-sucedida, seja pública ou privada, são as pessoas. Vamos trabalhar de maneira mais estratégica, em vez de ser uma unidade meramente operacional que roda a folha de pagamento”, avaliou.
Outra preocupação, relacionada àqueles que ainda prestarão concursos públicos, é a possível demissão de servidores com vínculo por prazo indeterminado por conta de pressões políticas ou decisões pessoais do gestor. Ainda que o secretário ressalte os critérios do texto legal para prevenir o servidor dessas situações, o cenário pode levar a entendimentos muito subjetivos, gerando prejuízo aos funcionários.
“É uma preocupação legítima das pessoas que pretendem prestar concurso. No texto da PEC, há um dispositivo que prevê que é vetado o desligamento por questões político-partidárias. No caso do prazo indeterminado, serão previstas em lei as possibilidades de desligamento. O Congresso vai definir em que situações isso será possível. Significa dizer que não vai poder desligar por questões de preferência pessoal. Vai ter que respeitar o princípio da impessoalidade, vai ter processo administrativo, o desligamento terá que ser fundamentado, vai ter direito a ampla defesa. Todos esses cuidados vão continuar existindo mesmo para o grupo com vínculo com prazo indeterminado. E o Judiciário estará presente como última salvaguarda se ocorrer casos de injustiça”, argumenta o secretário.
De acordo com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o governo espera uma economia de cerca de R$ 300 bilhões em 10 anos, a partir da aprovação da reforma administrativa nos termos em que foi proposta. Guedes afirmou ainda que espera um aumento de produtividade dos servidores a partir da reforma e que considera a digitalização do serviço público.
Para o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a reforma atinge o ponto correto ao ter foco no “futuro do serviço público”. “Não podemos mais tirar dinheiro da sociedade com os impostos e do outro lado sair muito pouco em serviços para a sociedade. Diálogo aberto, franco e transparente nos dará a condição de cumprir um grande desafio nos próximos meses: o nosso acordo, que acabou atrasando pela pandemia, que a Câmara tratava da reforma administrativa, o Senado, do pacto federativo, e o Congresso, da reforma tributária. Voltamos ao eixo do nosso trabalho”, disse.
Na Câmara dos Deputados, a tramitação do projeto da reforma administrativa começará pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), para análise da admissibilidade. Depois, o texto segue para uma comissão especial, que avaliará o mérito. A última etapa é no plenário da Câmara dos Deputados para então o texto seguir para o Senado Federal.
A polêmica seguirá nos próximos meses e será necessário observar com calma as mudanças que poderão ser propostas no texto enviado ao Congresso.
Escrito por: Redação